Descrição - Mondego

 

Morfologia

O Rio Mondego drena uma bacia hidrológica de cerca de 6670 km2 na faixa costeira ocidental de Portugal. O estuário do Mondego - Figura 1 - tem uma área de 3.4 km2, uma profundidade média de cerca de 2 metros e uma profundidade típica de cerca de 4, nas zonas subtidais.  A deposição de sedimentos na zona de jusante  levou à formação de uma ilha que individualiza dois braços – braço Norte e braço Sul – cerca de 7 km de comprimento. O braço Norte com profundidades máximas de 10 m é o mais profundo e mais dinâmico. O Canal Sul está particularmente assoreado nas zonas de montante. Como consequência das diferenças morfológicas, propagação muito diferente nos dois canais, podendo o nível atingir os 5 metros em preia-mar no canal norte, enquanto que no canal sul não ultrapassa os 4 (Marques, 1990).

O nível da maré na embocadura tem uma variação idêntica à de outros estuários Portugueses, variando entre 0.35 e 3.3 metros, com uma semi-amplitude média da ordem de 1 metro. O caudal médio do rio são 79 m3/s. Em anos húmidos o caudal médio pode ultrapassar os 140 m3/s e em anos secos pode ser inferior a 27 m3/s. Os tempos de residência foram estimados em 2 dias no braço Norte e são um pouco superiores no braço Sul. A Tabela 1 resume as características físicas do Estuário do Mondego.

Tabela 1: Síntese dos parâmetros físicos do estuário do Mondego

Parâmetro físico

Valor

Comprimento e largura (km)

Área (km2)

Profundidade média (m)

Variação do nível de maré (m)

Área da bacia hidrográfica (km2)

Caudal do rio (m3/s)

Tempo de residência (dias)

Temperatura (ºC) (máximo e mínimo anuais)

10 ; 0.3

3.4

2

0.35 – 3.3

6670

270

2

7 – 32

 

Dados de campo

Os dados que existem não permitem a caracterização exaustiva do estuário. Eles são no entanto suficientes para implementar o modelo e para o verificar.

A informação batimétrica utilizada é proveniente das cartas hidrográficas de levantamentos efectuados em 1995 e 1996 pela Direcção Geral de Portos e de informação cedida pela Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC). A Figura 1 mostra a batimetria usada pelo modelo na zona do baixo estuário e na plataforma exterior. A figura mostra também a localização dos pontos para os quais são apresentados resultados do modelo na forma de séries temporais. Na figura são visíveis as maiores profundidades no braço norte do estuário e o assoreamento do canal sul na zona de montante, responsável pelas menores caudais e velocidades neste canal.

 

Figura 1: Batimetria do Mondego e localização dos pontos para o qual são apresentados resultados do modelo na forma de séries temporais.

 Níveis de maré e salinidades

Níveis de maré e salinidades estão disponíveis nos pontos três pontos mais próximos da barra representados na Figura 1 (campanhas de medida da FCTUC, Marques, 1990) e salinidades nos dois pontos dos canais norte e sul. O ponto 1 situa-se perto da barra do rio, na zona dos estaleiros navais. Os pontos 2 e 3 estão situados respectivamente no braço norte e sul. Para o ponto 4 a montante da bifurcação são também apresentados resultados do modelo. As medições foram efectuadas em situação de Verão (Julho de 1989) e de Inverno, em Dezembro do mesmo ano. As medidas efectuadas nestes pontos são comparadas com os resultados do modelo no parágrafo seguinte.

Modelação

Foi estabelecido o modelo hidrodinâmico do estuário com base no módulo de hidrodinâmica tridimensional, MOHID 2000. Este modelo resolve as equações primitivas, usando um algoritmo semi-implícito, baseado em volumes finitos, e permite a simulação de escoamentos produzidos por diferentes agentes forçadores (maré, o vento densidade). Com este modelo foi simulado o escoamento e o transporte de salinidade em condições de maré e caudal do rio médios. O escoamento e o tempo de residência foram visualizados usando traçadores lagrangeanos.

O modelo foi corrido considerando todas as componentes de maré disponíveis, de modo a gerar o escoamento de maré nos períodos para os quais estão disponíveis medidas (Julho e Dezembro de 1989).

 A malha de calculo tem passo variável entre os 20 e os 100 metros, com um total de cerca de 42000 pontos. O passo especial menor é usado na zona da embocadura e da parte inferior do estuário onde a batimetria é mais complexa e são esperados maiores gradientes de velocidade. O passo espacial aumenta gradualmente para o interior do estuário, em direcção ao rio e para o exterior em direcção ao oceano.

Verificação do modelo

O modelo foi verificado usando as medidas de níveis e de salinidades nos 4 pontos apresentados na Figura 1 . As Figura 3 até à Figura 7 apresentam comparações entre os valores medidos e calculados naqueles pontos.

Figura 2: Comparação entre níveis medidos calculados no ponto 1 (ponto mais próximo da embocadura na Figura 1 ). Situação de Julho de 1989.

Figura 3: Comparação entre níveis medidos calculados no ponto 2 (ponto no braço Norte na Figura 1 ). Situação de Julho de 1989.

Figura 4: Comparação entre níveis medidos calculados no ponto 3 (ponto no braço sul na Figura 1 ). Situação de Julho de 1989.

As figuras mostram que os resultados das simulações comparam bem com os valores medidos em todos os pontos, quer em maré viva, quer em maré morta. As comparações são feitas com os dados em bruto, que incluem o efeito de todos os agentes forçadores. Pequenos desvios em alturas específicas podem ser atribuídas a esse facto. As séries temporais medidas são no entanto insuficientes para fazer uma análise harmónica para extrair o escoamento devido exclusivamente à maré. A comparação com os dados em bruto tem no entanto a vantagem de mostrar que a maré efectivamente o principal agente forçador do escoamento.

A salinidade foi simulada usando o módulo de transporte euleriano do sistema MOHID2000. Nesta simulação foi resolvido explicitamente o transporte horizontal e implicitamente o vertical. A discretização espacial pode usar diferenças centradas, upwind ou Quick. Nestas simulações foi usado o método upwind, tirando partido do facto de a malha ter passos muito finos (20 metros na zona principal do estuário).

As salinidades calculadas são comparadas com as medidas efectuadas na situação de Verão. Os valores exactos do caudal do rio naquela altura não é conhecido, mas é da ordem de grandeza do usado nas simulações 30m3/s. Os resultados são apresentados nas Figura 5 à Figura 7 . As figuras mostram boa concordância no canal principal (norte) e no canal sul. No canal sul a amplitude da variação da salinidade é muito baixa, pondo em evidência as baixas velocidades neste canal. Os resultados mostram que a repartição de caudais entre os canais simulada pelo modelo está de acordo com as medidas.

Figura 5: Comparação entre as medidas de salinidade e resultados do modelo no ponto. 2 da Figura 1 (ponto no braço norte).

Figura 6: Comparação entre as medidas de salinidade e resultados do modelo no ponto. 1 da Figura 1 (ponto mais próximo da embocadura).

A Figura 7 mostra séries temporais nos quatro pontos indicados na Figura 1 . A análise da figura mostra que nestas condições de caudal o ponto 4 é aproximadamente o limite de penetração da cunha salina.

Figura 7: Séries temporais de salinidade nos quatro pontos indicados na Figura 1 .

 Hidrodinâmica

Os resultados relativos aos escoamentos em vazante e em enchente põem em evidência as diferenças de velocidades entre os dois canais, com velocidades muito mais intensas no canal norte. As salinidades medidas e calculadas mostram evoluções que põem em evidência as consequências no transporte desta assimetria do escoamento.

Os resultados mostram também o jacto de vazante típico dos estuários sujeitos a maré e com embocaduras estreitas. Este jacto é o principal responsável pelo escoamento residual apresentado. As velocidades instantâneas ultrapassam 1 m/s e as velocidades residuais os 10 cm/s.

O escoamento residual mostra o jacto de saída, os dois vórtices associados e a deflexão para norte e um vórtice intensa na bacia artificial construída na embocadura para proteger o porto de pesca localizado no interior do estuário. A intensidade deste jacto (que está associada ao estrangulamento da embocadura) dificulta a reentrada da água de vazante no estuário, sendo o principal responsável pela rápida renovação da água no seu interior.

 

Salinidade

Os resultados mostram as diferenças de escoamento entre os canais norte e sul, com excursões de maré muito maiores no primeiro, o qual é quase completamente ocupado pela água doce em vazante. A figura referente à vazante põe também em evidência o jacto à saída e a de enchente mostra a assinatura da água doce deixada for a do estuário.

 

 Traçadores Lagrangeanos

Os traçadores lagrangeanos permitem visualizar o deslocamento das massas de água onde na qual  foram emitidos. Os traçadores foram emitidos em preia-mar, em caixas que permitem identificar as grandes zonas do baixo estuário (canais norte e sul, embocadura). As figuras põem em evidência os baixos tempos de residência da água no interior do estuário. As figuras mostram que, numa situação de caudal fluvial de 79 m3/s, o tempo de residência da água no canal norte é da ordem de dois dias e no canal sul é superior. No Canal Norte, em preia-mar, dois dias depois da emissão ainda há alguns traçadores, mas na baixa-mar seguinte já não. Pelo contrário os traçadores existentes no canal sul têm um movimento oscilatório que com deslocamento residual pouco intenso.

Os traçadores que saem a barra não voltam a entrar no estuário. No caso destas simulações foi considerado só o escoamento de maré. Se se tivesse considerado o escoamento de deriva litoral, a probabilidade de virem a entrar no estuário seria ainda menor.